quarta-feira, 21 de agosto de 2013
ATPC DE 20/8/13 A 27/8/13
UMA LEITURA PEDAGÓGICA DA INDISCIPLINA ESCOLAR
Agora vamos debater três grandes hipóteses
explicativas da questão disciplinar, tentando demonstrar que se trata de
versões diagnósticas que não se sustentam por completo, por três razões, pelo
menos:* a primeira é que elas estão apoiadas em algumas evidências equivocadas e em alguns pseudo-conceitos (como a visão romanceada da educação de antigamente, a moralização deficitária por parte dos pais, além da idéia do conhecimento escolar como algo ultrapassado e desestimulante);
* a segunda razão é que, de uma forma ou de outra, elas acabam isolando a indisciplina como um problema individual e anterior do aluno, quando, ao contrário, a ato indisciplinado revela algo sobre as relações institucionais-escolares nos dias atuais;
* a terceira razão deve-se ao fato de que as três hipóteses esquivam-se de levar em consideração a sala de aula, a relação professor-aluno e as questões estritamente pedagógicas. Elas esboçam razões para a indisciplina, mas não apontam caminhos concretos para sua superação ou administração.
Essas três hipóteses explicativas cometem um engano, já de largada, que é o de tomar a disciplina como um pré-requisito para a ação pedagógica, quando, na verdade, a disciplina escolar é um dos produtos ou efeitos do trabalho cotidiano de sala de aula. E todos sabemos disso de alguma maneira, por mais que evitemos o peso dessa constatação...
É sempre bom lembrar que um mesmo aluno indisciplinado com um professor nem sempre é indisciplinado com os outros. Sua indisciplina, portanto, parece ser algo que desponta ou se acentua dependendo das circunstâncias. Por isso, talvez devêssemos nos indagar mais sobre essas circunstâncias, e, por extensão, despersonalizar o nosso enfrentamento dos dilemas disciplinares.
Quase sempre se imagina que é necessário os alunos apresentarem previamente um conjunto de ações disciplinadas (como: ser "obediente", permanecer "em silêncio" etc.) para, então, o professor poder iniciar seu trabalho. E esse é um equívoco sério, porque, em nome dele, perde-se um tempo precioso tentando-se disciplinar os hábitos discentes.
Qual uma possível saída, então? Qual outra visão alternativa que não se paute em nenhuma das três comentadas até agora, ou, mais ainda, que evite a tentação de incorrer em um pot-pourri de todas elas? Gostaríamos de propor uma outra hipótese diagnóstica, agora de cunho explicitamente escolar, para que pudéssemos olhar com outros olhos a indisciplina "nossa de cada dia", um dos "ossos de nosso ofício"...
Tomando a indisciplina como uma temática fundamentalmente pedagógica, talvez possamos compreendê-la inicialmente como um sinal, um indício de que a intervenção docente não está se processando a contento, que seus resultados não se aproximam do esperado.
Desse ponto de vista, a indisciplina passa, então, a ser algo salutar e legítimo para o professor. Indisciplina é um evento escolar que estaria sinalizando, a quem interessar, que algo, do ponto de vista pedagógico, e mais especificamente da sala de aula, não está se desdobrando de acordo com as expectativas dos envolvidos. O que fazer, então? Como interpretar claramente o que a indisciplina está indicando de forma indireta? Vamos por partes.
Em geral, o trabalho docente é compreendido como a associação de duas, digamos, grandes "dimensões". Uma que é a dos conteúdos específicos e outra que é a dos métodos utilizados. Ou seja, no ideário pedagógico, a fórmula da intervenção docente resume-se a uma equação como esta: "ensina-se algo de alguma forma".
Gostaríamos, a partir de agora, de adicionar a essa combinação pedagógica clássica um terceiro dado, que chamaremos de dimensão "ética" do trabalho docente. Assim, nossa fórmula pedagógica passaria a contar com mais um elemento: "ensina-se algo, de alguma forma, a alguém específico". Longe de psicologizar o ato educativo, o que se quer dizer com isso? A dimensão dos conteúdos refere-se a "o quê se ensina", a dimensão dos métodos ao "como se ensina", e a dimensão ética ao "para que se ensina": aquilo que delimita o valor humano e social da ação escolar, porque sempre inserido em uma relação concreta.
Essa é uma distinção importante porque os grandes problemas que enfrentamos hoje evocam, na maioria das vezes, este "para quê escola?". Acreditamos, portanto, que grande parte dos nossos dilemas de todo dia exija um encaminhamento de natureza essencialmente éticos, e não metodológica, curricular ou burocrática.
Curiosamente, essa idéia parece apontar na mesma direção para a qual o aluno indisciplinado está incessantemente nos chamando a atenção. É essa a pergunta que ele está fazendo o tempo todo: para quê escola? Qual a relevância e o sentido do estudo, do conhecimento? No quê isso me transforma? E qual é meu ganho, de fato, com isso?
Temos conseguido responder essas perguntas quando direcionadas a nós mesmos? Qual a relevância e o sentido da escola, do ensinar e do aprender para nós, professores? Escola realmente faz diferença na vida das pessoas? Se ela marca uma diferença sem precedentes, por que ela geralmente é conotada como um lugar entediante, supérfluo, aquém da "realidade", inclusive para nós mesmos? Por que nos esforçamos em imaginar, tal como nossos alunos, que a "vida mesmo" está para além dos muros escolares? E por que é que o mundo deixou (e parece deixar cada vez mais) de parecer com um grande livro aberto?
Todas essas indagações são inadiáveis hoje em dia porque se o professores, na qualidade de profissionais privilegiados da educação, tiverem clareza quanto a seu papel e ao valor do seu trabalho, eles conseguirão ter um outro tipo de leitura sobre o cotidiano da sala de aula, sobre os problemas que se apresentam e as estratégias possíveis para o seu enfrentamento.
Por incrível que possa parecer à primeira vista, grande parte de nossos contratempos profissionais pode ser resolvida com algumas idéias simples e eficazes, mesmo porque muitas das armadilhas que o cotidiano nos arma parecem ter nossa anuência, quando não nossa autoria. Portanto, rever posicionamentos endurecidos, questionar crenças arraigadas, confrontar posicionamentos imutáveis, debater-se contra fatalidades: eis algo que, antes de ser uma obrigação, significa uma oportunidade ímpar de vivência dessa profissão, de certo modo, extraordinária.
Para que isso possa ser otimizado, algumas premissas pedagógicas precisam ser preservadas (e fomentadas, é claro) no trabalho de todo dia, de sala de aula. E essas premissas ultrapassam o plano dos conteúdos e dos métodos, ou melhor, elas os abarcam.
Nada de muito complexo, ao contrário. Tendo-as em mente, todo o
resto (disciplina, aproveitamento, interesse, credibilidade, sucesso escolar)
virá a contento... Vale a pena apostar!
ALGUMAS PREMISSAS
PEDÁGOGICAS FUNDAMENTAIS
Há,
a nosso ver, alguns princípios éticos balizadores de nosso trabalho, e estes
implicam, inicialmente, quatro elementos básicos, a saber:
* o conhecimento,
que é o objeto exclusivo da ação do professor. O âmbito de atuação do professor
é o essencialmente pedagógico. Portanto, ater-se ao seu campo de conhecimento e
suas regras particulares de funcionamento, nunca à moralização dos hábitos, é
uma medida fundamental;
* a relação
professor-aluno, que é o núcleo do trabalho pedagógico, uma vez que o aluno
é nosso parceiro, co-responsável pelo sucesso escolar, portanto. Mas é
fundamental que seja preservada a distinção entre os papéis de aluno e de
professor. Não se pode esquecer nunca que é dever do professor ensinar, assim
como é direito do aluno aprender. Isso nem sempre é claro ainda para o aluno,
principalmente aqueles do ensino fundamental, o que não significa que o mesmo
deva acontecer conosco;
* a sala de aula,
que é o contexto privilegiado para o trabalho, o microcosmo concreto onde a
educação escolar acontece de fato. É lá também que os conflitos têm de ser
administrados, gerenciados. É lá, e apenas lá, que se equacionam os obstáculos
e que se atinge uma possível excelência profissional. Portanto, mandar aluno
para fora de sala (e, no limite, para fora da escola) é um tipo de prática
abominável, que precisa ser abolida urgentemente das práticas escolares brasileiras;
* o contrato
pedagógico. Trata-se da proposta de que as regras de
convivência, muitas vezes implícitas, que orientam o funcionamento da sala de
aula - e daquele campo de conhecimento em particular - precisam ser explicitadas para todos os
envolvidos, conhecidas e compartilhadas por aqueles inseridos no jogo escolar,
mesmo se elas tiverem de ser relembradas (ou até mesmo transformadas) todos os
dias. Portanto, a medida mais profícua é a seguinte: jamais iniciar um curso ou
um ano letivo sem que as regras de funcionamento dessa "sala de
aula/laboratório" sejam conhecidas, partilhadas e, se possível, negociadas
por todos. É na medida em que todos se sentem co-responsáveis pelo
"código" de regras comuns que se pode ter parceria, solidariedade, um
projeto conjunto e contínuo - o que, no caso do trabalho pedagógico, é mais do que necessidade,
é uma exigência.
AS CINCO REGRAS ÉTICAS DO TRABALHO DOCENTE
Gostaríamos
de finalizar essa breve incursão no tema disciplinar com a proposição de cinco regras éticas, assim como as temos denominado, as
quais falam por si mesmas. Se o professor levar em consideração essas possíveis
balizas de convivência no seu trabalho cotidiano, os seus "problemas"
disciplinares deixarão de ser prioritários, uma vez que elas instauram a
intervenção do professor, e não as condutas da clientela, como norte da ação
escolar. Também, em nosso ponto de vista, trata-se do único antídoto contra o
fracasso escolar ou os tais "distúrbios de aprendizagem", e até mesmo
contra a terrível falta de credibilidade profissional que nos assola e da qual
padecemos tão severamente nesses últimos tempos. E quais são essas regras?
* a primeiríssima regra implica a compreensão do
aluno-problema como um porta-voz das relações estabelecidas em sala de aula.
O aluno-problema não é necessariamente portador de um "distúrbio"
individual e de véspera, mesmo porque o mesmo aluno "deficitário" com
certo professor pode ser bastante produtivo com outro. Temos que admitir, a
todo custo, que o suposto obstáculo que ele apresenta revela um problema comum,
sempre da relação. Vamos investigá-lo, interpretando-o como um sinal dos
acontecimentos de sala de aula. Escuta: eis uma prática intransferível!
* a segunda regra ética refere-se à des-idealização do perfil de aluno. Ou seja, abandonemos a imagem do aluno
ideal, de como ele deveria ser, quais hábitos deveria ter, e conjuguemos nosso
material humano concreto, os recursos humanos disponíveis. O aluno, tal como
ele é, é aquele que carece (apenas) de nós e de quem nós carecemos, em termos
profissionais.
* a terceira regra implica
a fidelidade ao
contrato pedagógico. É obrigatório que não abramos mão, sob hipótese
alguma, do escopo de nossa ação, do objeto de nosso trabalho, que é apenas um:
o conhecimento. É imprescindível que tenhamos clareza de nossa tarefa em sala
de aula para que o aluno possa ter clareza também da dele. A visibilidade do
aluno quanto ao seu papel é diretamente proporcional à do professor quanto ao
seu. A ação do aluno é, de certa forma, espelho da ação do professor. Portanto,
se há fracasso, o fracasso é de todos; e o mesmo com relação ao sucesso
escolar.
* a quarta regra é a experimentação
de novas estratégias de trabalho. Precisamos
tomar o nosso ofício como um campo privilegiado de aprendizagem, de
investigação de novas possibilidades de atuação profissional. Sala de aula é
laboratório pedagógico, sempre! Não é o aluno que não se encaixa no que nós
oferecemos; somos nós que, de certa forma, não nos adequamos às suas
possibilidades. Precisamos, então, reinventar os métodos, precisamos reinventar
os conteúdos em certa medida, precisamos reinventar nossa relação com eles,
para que se possa, enfim, preservar o escopo ético do trabalho pedagógico.
* a última regra ética, e com a qual encerramos nosso percurso, é
a idéia de que dois são os valores básicos que devem presidir nossa ação em
sala de aula: a competência e
o prazer. Quando podemos (ou conseguimos) exercer esse ofício
extraordinário que é a docência com competência e prazer - e, por extensão, com generosidade -, isso se traduz também na maneira com que o aluno exercita o seu
lugar. O resto é sorte. E por falar nisso, boa sorte a todos! (
Júlio Groppa )
Aproveitando esse
tempo de estudo, pois o texto acima é material para prova de mérito e outras.
Segundo o texto a indisciplina esta baseada em três hipóteses e a partir desse
ponto, ela pode ser amenizada através de algumas etapas, você se aplica ou
tentaria aplicar tais premissas ! Quais!
Como! Porquê
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